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Inconsciente Mecânico

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Inconsciente Mecânico

 

Otavio Schipper e Sergio Krakowski

 

Uma mesa suspensa. Sobre ela, pequeninas mesas comportam estranhos objetos mecânicos. São telégrafos; objetos de um passado próximo, mas cuja imagem e materialidade em nada se parecem com nosso objetos cotidianos de comunicação. Os objetos “falam”, tocam como instrumentos ritmados, seguindo uma comunicação que se conduz por fios. O tempo aqui parece oscilar como a luz da única lâmpada que ilumina a sala. Tudo nos escapa, a não ser a consciência de que algo acontece apesar de nós. “Inconsciente Mecânico” é uma parceria entre o artista plástico Otavio Schipper e o músico e compositor Sérgio Krakowski. A Carbono realizou uma entrevista com os autores para saber mais da obra, seu processo e o encontro entre os dois.

 

Carbono: De onde surge o “Inconsciente Mecânico”? Que questões que geraram este trabalho?

Otavio Schipper e Sérgio Krakowski: Neste projeto a nossa proposta inicial consistia em testar os limites e as relações entre as linguagens naturais e artificiais, e achamos que seria interessante criar uma situação onde diversas formas de comunicação pudessem ser experimentadas. Decidimos portanto criar um diálogo entre antigos telégrafos, vozes sintéticas e sons telefônicos, totalmente controlado através de um sistema capaz de realizar traduções a partir do ritmo das palavras e dos sons telefônicos.

Porque escolheram associar a mecânica ao inconsciente? Como  a física pode encontrar temas tão fugidios como o sonho e a memória?

A Era Moderna acelerou o processo de extrema mecanicização do pensamento no mundo ocidental. Se por um lado o advento da psicanálise nos trouxe importantes ferramentas para lidar com alguns aspectos da natureza humana, a impossibilidade de se lidar com o irracional, o transcendente, o indefinível, que aquela mecanicização nos trouxe, nos transformou em seres amputados, fadados a entrar em um vórtice de atos automatizados e cindidos das outras esferas do real. Lidar com essas questões foi o que nos motivou a criar essa obra, mas ela carrega em si a sua interpretação e nossa motivação não a esgota. A aparente distância entre a física e o sonho é apenas mais um sintoma da incapacidade do homem moderno em compreender a síntese que é de fato o Homem.

Telégrafos atuando em rede. Existe uma transmissão acontecendo nessa cadeia?

Sim, as vozes sintéticas e os sons telefônicos espacializados nas quatro caixas de som que rodeiam a instalação tem seu sinal analisado em tempo real e suas articulações controlam a ativação dos telegrafos em alguns momentos da peça musical. O diálogo entre os objetos é real.

O “Inconsciente Mecânico” resulta também em uma experiência sonora. Como construíram esta composição?

Essa composição foi construída em parceria. O Otavio escolheu o material sonoro a ser utilizado, os sons de telefones antigos, o conteúdo dos textos a serem lidos pelas vozes-autômatos, enquanto que o Sergio definiu a sequência e a espacialização do material. A peça é cíclica, e composta por quatro unidades dia/noite que se alternam. O dia corresponde aos momentos onde a voz sintética é traduzida pelos telégrafos e a lâmpada que se localiza no centro da insatalação brilha com maior intensidade. À noite, essa lampada permanece quase apagada, enquanto sons de telefone são espacializados ao redor da exposição, e os telégrafos assumem dinâmicas ‘ritualísticas’, ciclos rítmicos que não parecem ter conexão com seu entorno. Todas essas construções não são concebidas para serem percebidas pelo público, mas serviram apenas de alicerce para a construção da peça.

Como se deu o encontro entre vocês?

Nos conhecemos em 1997, quando estudavamos respectivamente Física e Matemática na UFRJ. Desde então começamos a estabelecer um diálogo interessante, multidisciplinar, e acabamos voltando a trabalhar novamente no laboratório de computação gráfica do Insituto de Matemática Pura e Aplicada em 2006.

Além de artistas, Sérgio é matemático e Otávio é físico. Existe uma conversa entre essas esferas do saber?

Entre essas e a psicanálise, a música, a arqueologia….basta que nos desprendamos das amarras da racionalidade moderna.

 

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OTAVIO SCHIPPER é artista plástico e formado em Física pela UFRJ. Trabalhou no grupo de computação gráfica do Instituto de Matemática Pura e Aplicada e participou de diversas exposições como “Arte Brasileira Hoje” (MAM, Rio de Janeiro, e Pinacoteca, São Paulo, 2005) e a exposição individual “Fluido Percurso”, no Paço Imperial, Rio de Janeiro. Em 2010 apresenta a instalação sonora “Inconsciente Mecânico”, no Centro Cultural Maria Antônia em São Paulo e na galeria Anita Schwartz no Rio de Janeiro em 2011.
http://otavioschipper.com/ 

SERGIO KRAKOWSKI é músico, compositor e doutor em Matemática pelo Instituto de Matemática Pura e Aplicada. Trabalhou no laboratório Sony/CSL-Paris desenvolvendo um sistema que utiliza o ritmo como interface entre o músico e o computador. Criador do projeto TelecotecnoFunk pela gravadora Biscoito Fino, se apresenta em diversos shows e festivais de música e tecnologia e realiza workshops de percursão nas cidades Milão, Londres, Brighton, Montpelier.

 

Entrevista realizada por Marina Fraga em junho de 2013.

 

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